Relatório Internacional sobre Liberdade Religiosa de 2019: Brasil

Sumário executivo

A constituição declara que a liberdade de consciência e crença é inviolável e garante o livre exercício da crença religiosa.  A constituição proíbe os governos federal, estaduais e municipais de apoiar ou impedir qualquer religião.  Em março, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o sacrifício de animais em rituais religiosos é constitucional, observando que é necessária proteção especial para as religiões afro-brasileiras tradicionais devido à história de discriminação do país contra estas religiões.  O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul deu continuidade ao processo de julgamento dos acusados de ataque antissemita em 2005 contra três homens que vestiam kipás em Porto Alegre, capital do estado.  Em março, um policial militar e um servidor do tribunal impediram o advogado Matheus Maciel de entrar em dois tribunais no estado da Bahia porque usava uma cobertura religiosa na cabeça.  Em seguida, Matheus foi autorizado a entrar em um tribunal depois de telefonar para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e denunciar o incidente.  Em abril, a administração da Escola de Ensino Fundamental Tarcila Cruz de Alencar, localizada no Ceará, retirou da sala de aula a professora de história Maria Firmino por ensinar sobre cultura e história das religiões afro-brasileiras.  Em 3 de janeiro, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei que permite que alunos de escolas públicas e privadas, exceto aqueles em treinamento militar, adiem os exames ou participem de aulas no dia de adoração, quando sua fé proíbe tais atividades.  Em 21 de agosto, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou um projeto de lei que estabelece penas administrativas a pessoas e organizações que praticam intolerância religiosa.  O Senado aprovou um projeto de lei que cria o Dia Nacional do Espiritismo, data anual, a ser comemorada em 18 de abril, e um segundo projeto de lei que designa Jaguaretama, no Ceará, como a Capital Nacional do Espiritismo.  Em 21 de janeiro, os municípios de todo o país comemoraram o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.  Em 26 de março, o Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, Paulo Mascaretti, lançou uma campanha de conscientização juntamente com o Fórum Interreligioso, entidade com participação da sociedade civil e grupos religiosos, no sentido de combater a intolerância.

Segundo dados nacionais obtidos de ligações para a central telefônica de direitos humanos e outras fontes, o respeito da sociedade por praticantes de religiões minoritárias continuou tímido, e não cessaram os ataques violentos aos terreiros afro-brasileiros.  Embora menos de 1% da população siga as religiões afro-brasileiras, 30% dos casos registrados pela central telefônica de direitos humanos envolveram vítimas praticantes de religiões afro-brasileiras.  De acordo com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, a central telefônica nacional de direitos humanos recebeu 506 denúncias de intolerância religiosa em 2018, em comparação com 537 em 2017.  De abril a agosto, a imprensa noticiou que membros de organizações criminosas atacaram vários terreiros na região da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, expulsando seguidores religiosos e impedindo cultos religiosos afro-brasileiros.  Em 13 de junho, policiais do Rio de Janeiro de quatro delegacias diferentes, inclusive do Departamento de Polícia Civil do Rio de Janeiro para Crimes Raciais e Intolerância (DECRADI), lançaram uma operação para deter pessoas que participaram dos ataques e prenderam oito indivíduos.  Em janeiro, depois que a rede de televisão Record News perdeu um processo de 15 anos em que foi acusada de promover intolerância religiosa às religiões afro-brasileiras, a organização pagou uma multa de R$600.000,00 (US$ 149,000) e produziu e transmitiu quatro programas de 20 minutos sobre as religiões afro-brasileiras.  Organizações religiosas organizaram eventos comunitários interreligiosos, entre eles a 22ª Caminhada Azoany em Defesa da Liberdade Religiosa, em Salvador, Bahia, em 16 de agosto, que reuniu cerca de 2.500 praticantes de religiões afro-brasileiras em prol da proteção da cultura e religião afro-brasileiras.

Em abril e setembro, representantes da embaixada dos EUA contataram o coordenador de diversidade religiosa do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos para discutir o empenho do governo em promover a tolerância religiosa e impedir a violência contra as religiões afro-brasileiras.  Em julho, os representantes da embaixada se reuniram com a Delegacia Especial de Polícia do Distrito Federal para a Prevenção de Crimes de Discriminação, em virtude de raça, religião, orientação sexual, idade ou deficiência (DECRIN), que abrange especificamente crimes de ódio religioso.  Após a indicação pela embaixada e consulados, Ivanir dos Santos, ativista e líder religioso afro-brasileiro, recebeu o Prêmio Internacional de Liberdade Religiosa do Secretário de Estado por seu compromisso excepcional com o avanço da liberdade religiosa.  Em seu trabalho, fundou a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, uma organização independente composta por representantes de diferentes grupos religiosos, membros da sociedade civil, a polícia e o Ministério Público, que documenta casos de intolerância religiosa e auxilia as vítimas.  Em abril, representantes da embaixada e do consulado se reuniram com representantes da Federação Israelense do Rio de Janeiro para discutir o antissemitismo no país.  Em maio, representantes da embaixada e do consulado se reuniram com representantes da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (Igreja de Jesus Cristo) em sua sede nacional em São Paulo para discutir a importância de proteger a liberdade religiosa.  Em maio e agosto, representantes do consulado do Recife se reuniram com representantes da Federação Israelense de Pernambuco para discutir questões que afetam a comunidade judaica.  Autoridades do Consulado de São Paulo se reuniram com líderes cristãos evangélicos em julho para discutir o papel dos líderes religiosos na promoção da tolerância religiosa.  Em dezembro, a embaixada promoveu um diálogo interreligioso com sete representantes de seis organizações religiosas e interreligiosas a fim de discutir o estado da liberdade religiosa no país.

O governo estima a população total em 210,3 milhões (estimativa no 1º  semestre de 2019).  De acordo com uma pesquisa do Datafolha de 2016, 50% da população se identifica como católica, em comparação com 60% em 2014.  Durante o mesmo período, a proporção de ateus aumentou de 6% para 14%, e a proporção de cristãos evangélicos aumentou de 24% para 31%.  Segundo o censo de 2010, 65% da população é católica, 22% protestante, 8% irreligiosa (inclusive ateus, agnósticos e deístas) e 2% espírita.  Seguidores de outros grupos cristãos, entre os quais as Testemunhas de Jeová, a Igreja de Jesus Cristo, os Adventistas do Sétimo Dia, bem como seguidores de religiões não-cristãs, inclusive budistas, judeus, muçulmanos, hindus e grupos religiosos afro-brasileiros e sincréticos, como o Candomblé e a Umbanda representam 3% da população.  Segundo o censo, existem 588.797 praticantes de candomblé, umbanda e outras religiões afro-brasileiras, e alguns cristãos também praticam candomblé e umbanda.  De acordo com uma pesquisa não representativa de 2017, feita pela Universidade de São Paulo com 1.000 pessoas acima de 18 anos, 44% dos brasileiros se consideram praticantes de mais de uma religião.

Segundo o censo de 2010, aproximadamente 35.200 muçulmanos vivem no país, enquanto a Federação das Associações Muçulmanas do Brasil estima que o número seja de 1,2 a 1,5 milhão.  As maiores comunidades residem em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Foz do Iguaçu, mas também se encontram em cidades menores nos estados do Paraná e Rio Grande do Sul.

Segundo a Confederação Judaica do Brasil, há aproximadamente 125.000 judeus no país.  As duas maiores concentrações são 65.000 no estado de São Paulo e 29.000 no estado do Rio de Janeiro.

Marco Legal

A constituição declara que a liberdade de consciência e crença é inviolável e garante o livre exercício da crença religiosa.  A constituição proíbe os governos federal, estaduais e municipais, de apoiar ou impedir qualquer religião.  A lei prevê penas de até cinco anos de detenção por crimes de intolerância religiosa, inclusive discriminação no emprego, recusa de acesso a áreas públicas e exibição, distribuição ou difusão de material intolerante à religião.  Os tribunais podem determinar multas ou detenção de um a três anos a qualquer pessoa que se envolver em discursos religiosos de ódio.  Se o discurso de ódio ocorrer por meio de publicação ou comunicação social, inclusive nas redes sociais, os tribunais podem determinar multas ou pena de detenção de dois a cinco anos.  É ilegal escrever, editar, publicar ou vender literatura que promova a intolerância religiosa.

Os grupos religiosos não precisam se registrar para estabelecer seus locais de culto, capacitar clérigos ou fazer proselitismo, mas os grupos que buscam isenção de impostos devem se registrar no Departamento da Receita Federal e no governo municipal.  Os estados e municípios têm requisitos e regulamentos diferentes para obter isenção fiscal.  A maioria das jurisdições exige que as congregações documentem seu propósito, forneçam registros contábeis e possuam sistema de prevenção de incêndio em qualquer local de culto.  As leis locais de zoneamento e do silêncio podem limitar onde um grupo religioso pode construir templos ou realizar cerimônias.

De acordo com uma decisão do STF de março, o sacrifício de animais em rituais religiosos é constitucional.

Os regulamentos governamentais exigem que as escolas públicas ofereçam instrução religiosa, mas nem a constituição nem a legislação definem os parâmetros.  Por lei, a instrução deve ser não-denominacional e conduzida sem proselitismo, e instruções alternativas para estudantes que não desejam participar devem estar disponíveis.  As escolas são obrigadas a ensinar religião, história e cultura afro-brasileiras.  Em 3 de janeiro, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei que permite que alunos de escolas públicas e privadas, exceto aqueles em treinamento militar, adiem os exames ou participem de aulas no dia de adoração, quando sua fé proíbe tais atividades.  A nova lei garante o direito dos alunos de expressar suas crenças religiosas e mandatos de que as escolas forneçam alternativas, inclusive exames de substituição ou aulas de reposição.

A lei proíbe subsídios públicos a escolas operadas por organizações religiosas.

Uma disposição constitucional prevê o direito de acesso a serviços religiosos e aconselhamento a indivíduos de todas as religiões em todos os estabelecimentos civis e militares.  A lei determina que hospitais públicos e privados, bem como penitenciárias civis ou militares, devem cumprir esta disposição.

Uma lei do Estado de São Paulo cria sanções administrativas para pessoas e organizações envolvidas em intolerância religiosa.  A pena varia desde uma carta de advertência até multas que chegam a R$9.000,00 (US$ 2,200).

O país é signatário do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP).

Práticas Governamentais

Continuaram os trâmites para a condenação de seis indivíduos acusados de ataque antissemita em 2005 contra três homens vestindo kipás em Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul.  Inicialmente, 14 indivíduos, membros de uma gangue de skinheads nazistas, foram acusados.  No final do ano, cinco dos 14 foram condenados e presos, um teve a queixa retirada e seis aguardavam julgamento ou adjudicação.

Em 13 de março, a imprensa noticiou que um policial militar e um funcionário do tribunal tentaram impedir que o advogado Matheus Maciel entrasse em dois tribunais em Salvador, Bahia, pois usava uma cobertura de cabeça de religião afro-brasileira conhecida como ekete.  O Tribunal de Justiça da Bahia proíbe o uso de coberturas de cabeça dentro de tribunais.  Mais tarde, Matheus foi autorizado a entrar no prédio depois de relatar o incidente à OAB, que é uma organização independente com representação em todo o país e que regula as profissão de advogado.  Segundo relatos da imprensa, Matheus criticou o que caracterizou de tentativas de restringir sua liberdade; Matheus entrou em contato com membros da Comissão de Intolerância Religiosa da OAB, que convocou uma reunião com todas as partes envolvidas para discutir como evitar incidentes semelhantes.

Embora as escolas públicas e privadas sejam obrigadas a ensinar religião, história e cultura afro-brasileiras, a imprensa relatou em abril que na Escola de Ensino Fundamental Tarcila Cruz de Alencar, localizada no Ceará, a administração retirou da sala de aula a professora de história Maria Firmino por ensinar a cultura e a história das religiões afro-brasileiras.  A escola, localizada em Juazeiro do Norte, Ceará, informou ao advogado da professora que pretendia retirá-la da sala de aula indefinidamente e designá-la para uma posição administrativa.  Maria Firmino, praticante do Candomblé, apresentou queixa contra a escola na Delegacia Regional de Juazeiro do Norte por não respeitar sua liberdade religiosa.  O Ministério Público Federal dos Direitos do Cidadão solicitou à Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte mais informações sobre a remoção.  A Promotoria do Estado do Ceará apresentou uma moção para iniciar um processo administrativo em 9 de maio, solicitando informações adicionais sobre o caso à Secretaria de Educação e ao diretor administrativo da escola.  A Polícia Civil do Ceará continuou investigando o caso até o final do ano.

De acordo com uma decisão do STF no mês de março, o sacrifício de animais em rituais religiosos é constitucional.  O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul levou o caso ao tribunal, contestando uma decisão do tribunal estadual permitindo que praticantes de religiões afro-brasileiras realizassem sacrifícios de animais.  A decisão do STF afirmou que o sacrifício ritualístico de animais nas religiões afro-brasileiras não é inconstitucional desde que seja “sem excesso ou crueldade”.  O magistrado Luís Barroso observou que era necessária proteção especial para as religiões afro-brasileiras tradicionais devido à história de discriminação do país.

Líderes religiosos afro-brasileiros dos subúrbios do norte do Rio, vítimas de intolerância religiosa, disseram que a polícia era indiferente a ataques a seus locais de culto, como evidenciado pela falta de investigações e prisões.

Em uma sessão especial em 29 de agosto, o Senado homenageou Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti, reconhecido como “o pai do espiritismo no Brasil”.  Bezerra de Menezes, que morreu em 1900, era conhecido como pacifista e humanista que defendia o direito dos indivíduos de seguir o Espiritismo, numa época em que a doutrina não era amplamente aceita.  O Senado aprovou um projeto de lei que cria o Dia Nacional do Espiritismo, a ser comemorado anualmente em 18 de abril, dia em que Allan Kardec publicou o Livro dos Espíritos em 1857 na França, o evangelho da doutrina espírita.  O Senado aprovou um segundo projeto de lei que designa Jaguaretama, Estado do Ceará, cidade natal de Menezes, como a Capital Nacional do Espiritismo. O senador cearense Eduardo Girao, ele próprio espírita, liderou essas iniciativas.

Em 21 de janeiro, os municípios de todo o país comemoraram o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.  A Promotoria Estadual de Salvador, Bahia, organizou uma Semana Afirmativa de Liberdade Religiosa, que incluiu uma caminhada interreligiosa, oficinas para discutir os canais e estratégias de assistência às vítimas e um seminário sobre a importância do sistema judiciário e o papel dos líderes religiosos na promoção da liberdade religiosa.

Em 26 de março, o Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, Mascaretti, lançou uma campanha de conscientização contra a intolerância religiosa dentro do estado.  O Fórum Interreligioso, entidade com participação da sociedade civil, coordenou a campanha por meio de reuniões, seminários e promoção da central telefônica nacional de direitos humanos.  O fórum tem 101 membros e reúne representantes de 22 grupos religiosos, inclusive budismo, islamismo, catolicismo, protestantismo, afro-brasileiro, ateus e agnósticos.

Em setembro, o governo divulgou seu terceiro relatório sobre o PIDCP, apresentando as principais medidas legislativas, judiciais e administrativas implementadas pelo governo entre 2004 e 2018, para proteger os direitos especificados no PIDCP.  Entre os destaques, a criação do Conselho Consultivo de Política de Diversidade Religiosa em 2011 sob a então Secretaria Nacional de Direitos Humanos e a criação do Comitê Nacional Participativo de Diversidade Religiosa em 2013.  Ambas as entidades são responsáveis pelo planejamento de políticas para defender e promover a liberdade religiosa, enfrentando a discriminação e a intolerância religiosa e promovendo o secularismo.  O relatório também destacou a adoção de uma recomendação de 2012 que exige a inclusão de um campo sobre intolerância religiosa nos registros de investigação criminal.

Embora menos de 1% da população siga as religiões afro-brasileiras, 30% dos casos registrados pela central telefônica de direitos humanos envolveram vítimas praticantes de religiões afro-brasileiras.  Quatro por cento dos casos registrados pela central telefônica de direitos humanos envolviam violência.  A imprensa relatou vários incidentes em que indivíduos e grupos destruíram terreiros e objetos sagrados.

Alguns líderes religiosos afirmaram que os ataques a grupos religiosos afro-brasileiros aumentaram em todo o país nos últimos anos, atribuindo o aumento da violência a grupos criminosos e um clima de intolerância promovido por grupos evangélicos.

Em junho, a imprensa noticiou que indivíduos não identificados vandalizaram o terreiro de Ase Olode Ala Orum, no bairro de Madureira, no Rio de Janeiro, danificando as paredes e destruindo objetos sagrados.  Este foi o segundo ataque no mesmo local em menos de quatro meses.  Segundo relatos da imprensa, o líder religioso, conhecido como pai de santo, decidiu não apresentar queixa por temer represálias.

Segundo a imprensa, em 11 de julho, cristãos evangélicos, supostamente envolvidos no tráfico de drogas, atacaram um templo de candomblé no bairro Parque Paulista de Duque de Caxias, na região da Baixada Fluminense no estado do Rio de Janeiro.  Os indivíduos invadiram o templo, que atua há mais de 50 anos, e forçaram a sacerdotisa a destruir todos os símbolos que representam os orixás (seres divinos).  Eles também ameaçaram incendiar o local se os praticantes não parassem de fazer cultos religiosos regulares.

Em 11 de abril, a imprensa noticiou que membros de organizações criminosas atacaram um terreiro em Flora Park, Nova Iguaçu, na região da Baixada Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro, e expulsaram seus membros. A propriedade está localizada fora da favela do Buraco do Boi, que segundo várias fontes da imprensa é controlada por organizações criminosas.  Segundo a imprensa, os criminosos expandiram seu território para a favela e baniram os cultos religiosos afro-brasileiros.  Alguém pichou um muro público de um bairro, com os dizeres: “Jesus é dono deste lugar”.

Em maio, o Ministério Público Federal (MPF) instou o governador do Estado do Rio de Janeiro a responder ao número cada vez maior de ataques que teriam como alvo praticantes de religiões afro-brasileiras e seus locais de culto na região da Baixada Fluminense do Estado do Rio de Janeiro.  Segundo o MPF, os traficantes de drogas liderados por um pastor evangélico cristão estavam ameaçando os praticantes da região, intimidando-os e impedindo-os de comparecer a cultos religiosos e organizar reuniões religiosas.  O MPF informou que a pressão contínua forçou o fechamento de pelo menos 15 terreiros em Duque de Caxias, Estado do Rio de Janeiro, somente no mês de maio.

Segundo relatos da imprensa, em 13 de junho, policiais do Estado do Rio de Janeiro de quatro delegacias diferentes, inclusive o DECRADI, lançaram uma operação para evitar novos ataques contra terreiros em Nova Iguaçu, no Estado do Rio de Janeiro.  Segundo relatos da imprensa, o MPF solicitou informações de 120 grupos religiosos que atuam em prisões autorizado pela Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro.  Segundo fontes da área de direitos humanos, muitos dos agressores eram traficantes de drogas antigos ou atuais que se converteram ao cristianismo evangélico na prisão, onde se radicalizaram para atacar minorias religiosas e, ao serem libertados, participaram de atos violentos.  Em agosto, policiais identificaram os organizadores, um grupo de traficantes que se autodenominavam Bonde de Jesus e prenderam oito pessoas acusadas de participar dos ataques, inclusive o suposto líder do grupo, Álvaro Malaquias Santa Rosa.

Em outros ataques a terreiros, não ficou claro se os autores pertenciam a um grupo religioso específico.  Em 12 de janeiro, a imprensa noticiou que seis homens armados entraram em um terreiro em Camaçari, Salvador, durante um evento público.  Os homens agrediram e feriram o líder religioso Babalorixá Rychelmy Esutobi e o fotógrafo não identificado do evento.  Os homens assaltaram membros do terreiro e seus convidados, levando consigo objetos sagrados, celulares e um carro.  A Polícia Civil do Ceará continuou investigando o caso até o final do ano.

Em 6 de maio, Carlos Roberto de Oliveira, vereador de Campinas, relatou ao Ministério Público um ataque ao Terreiro de Umbanda Vó Benedita.  De acordo com um comunicado divulgado pelo terreiro, os agressores vandalizaram três carros no estacionamento, e os membros ouviram os agressores gritarem: “Os terreiros da umbanda serão apedrejados”.  Um agressor  jogou pedras e outros objetos pesados no prédio e furou os pneus dos membros do terreiro.  Outro agressor ameaçou o líder do terreiro, João Galerane, à mão armada.  Até o final do ano, a polícia continuava suas investigações.

Em maio, a imprensa noticiou um ataque a um terreiro do Candomblé, próximo à Universidade Federal em Maceió, Estado de Alagoas.  Segundo o líder religioso Veronildes Rodrigues da Silva, alguém tentou invadir o terreiro numa noite de domingo, mas não conseguiu.  Os agressores voltaram novamente às 4h da manhã no dia seguinte.  Ninguém ficou ferido; no entanto, a área fora do portão foi danificada.  Da Silva apresentou queixa à Polícia Civil local.  Segundo fontes locais, o presidente da Comissão de Igualdade Social da Ordem dos Advogados do Estado de Alagoas pediu às autoridades que investigassem o ataque e se comprometeram a proteger o líder religioso.  A investigação continuou até o final do ano.

Em maio, a imprensa relatou que um grupo de aproximadamente 50 cristãos evangélicos organizou um culto religioso em frente a um terreiro do candomblé em Alagoinhas, no estado da Bahia.  Segundo o líder do terreiro, os cristãos evangélicos se tornaram agressivos, gritando: “Satanás morrerá” e “vamos invocar o nome de Jesus para fechar a casa de Satanás”.  Eles também jogaram cópias da Bíblia no portão do terreiro.

De acordo com a Associação Falun Dafa do Brasil, em março, uma exposição do Falun Gong em Brasília foi encerrada mais cedo devido à pressão da embaixada chinesa, que alguns adeptos do Falun Gong disseram acreditar ser uma tentativa de ocultar a perseguição do Falun Gong pelo Partido Comunista Chinês.  Segundo a associação, eles exibiram a mesma exposição na Universidade de Brasília em outubro, sem interferência da embaixada chinesa.

Entre abril e junho, a Liga Antidifamação (LAD) conduziu uma pesquisa para atualizar o entendimento de atitudes e opiniões em relação aos judeus em 18 países ao redor do mundo.  Em novembro, a LAD divulgou os resultados da pesquisa para cada país, detalhando o escopo das visões antissemitas entre os residentes daquele país. A pesquisa citou 11 declarações estereotipadas sobre judeus e perguntou aos entrevistados se eles concordavam com eles.  A proporção que concordou que várias afirmações eram “provavelmente verdadeiras” foi a seguinte:  70% concordaram que os judeus são mais leais a Israel do que ao Brasil; 38% dos judeus têm poder demais no mundo dos negócios; 63% dos judeus falam demais sobre o Holocausto; 27% que os judeus não se importam com o que acontece com ninguém, exceto com sua própria espécie; 25% dos judeus pensam que são melhores que as outras pessoas; e 39% que outras pessoas odeiam judeus por causa do modo como se comportam.  De acordo com a pesquisa, 25% da população nutria atitudes antissemitas – acima dos 16% da pesquisa anterior em 2015 -, que declarou representar a porcentagem de pessoas que concordaram que a maioria das 11 declarações era “provavelmente verdadeira”.

De janeiro a agosto, a Federação Israelense de São Paulo registrou 194 incidentes de antissemitismo no país em seu Relatório Antissemitismo de 2019.  De janeiro a novembro de 2018, a federação registrou 46 incidentes.  O relatório foi baseado em dados empíricos com incidentes provenientes de várias fontes, inclusive mídias tradicionais, redes sociais e relatórios de outras filiais da organização.  A pesquisa relatou avistamentos de suásticas e outras pichações antissemitas.

Houve relatos de entidades privadas e pessoas incitando violência ou assédio contra minorias religiosas nas redes sociais e na imprensa.  Entre janeiro e agosto, a Federação Israelense de São Paulo registrou 50 incidentes de comentários antissemitas compartilhados nas redes sociais.  Entre janeiro e outubro de 2018, eles registraram cinco reclamações de comentários antissemitas compartilhados nas redes sociais.

Em fevereiro, Arlindinho, filho de um famoso cantor de samba brasileiro, relatou sofrer ataques persistentes nas redes sociais devido à sua religião, o Candomblé.  Ele relatou ter recebido comentários negativos e ofensivos depois de postar fotos envolvendo sua religião nas redes sociais.  Arlindinho disse que estava considerando entrar com uma ação contra os agressores e iniciou uma campanha nas redes para combater a discriminação religiosa online.

A imprensa noticiou que Idalma Lima, praticante de uma religião afro-brasileira, recebeu ameaças nas redes sociais por compartilhar informações sobre um ritual envolvendo sacrifício de animais em sua página no Facebook.  Idalma Lima, advogada que mora em Santarém, no oeste do estado do Pará, disse que uma pessoa sugeriu que ela sacrificasse seus filhos menores em vez dos animais.  Ela apresentou uma queixa oficial à polícia local em 1º de abril; a polícia investigou o caso como um crime de intolerância religiosa.  A investigação continuou até o final do ano.

Em 6 de fevereiro, no reality show Big Brother Brasil, a concorrente Paula von Sperling Viana fez uma série de comentários depreciativos sobre outro concorrente que era seguidor de uma religião afro-brasileira.  A imprensa informou que o DECRADI concluiu que seus comentários eram discriminatórios, acusando-a de causar injúria devido à discriminação.  O Ministério Público negou provimento às acusações em outubro, constatando que não havia fundamento suficiente para o caso e citando o direito de Viana à liberdade de expressão.

Em janeiro, a Record News perdeu um processo de 15 anos em que o Ministério Público Federal, o Instituto Nacional de Tradição e Cultura Afro-Brasileira (TECAB) e o Centro de Estudos sobre Relações e Desigualdade Trabalhista (CEERT) acusaram a organização de usar sua programação para promover a intolerância religiosa às religiões afro-brasileiras.  Como parte do acordo, a organização matriz da rede, o Grupo Record, de propriedade do bispo Edir Macedo, fundador da igreja cristã evangélica Universal do Reino de Deus, concordou em transmitir quatro programas de 20 minutos sobre religiões afro-brasileiras projetados e produzidos pelo TECAB e pelo CEERT.  Em julho, o Grupo Record começou a transmitir a série, intitulada A Voz das Religiões Africanas.  Além de fornecer espaço na grade de transmissão e pagar os custos de produção, o Grupo Record teve que pagar R$300.000,00 (US$ 74,600) em indenizações ao TECAB e CEERT, no valor total de R$600.000,00 (US$ 149,000).

A Secretaria Nacional do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos recebeu 506 denúncias de intolerância religiosa por meio da central telefônica nacional de direitos humanos no Disque-100 em 2018, em comparação com 537 em 2017.  A maioria dos relatórios apontou a discriminação (48%), seguida de violência psicológica, inclusive ameaças, humilhação e hostilidade (31%), e violência institucional marcada pela discriminação no local de trabalho e em outros locais públicos (8%).  Quase metade dos 506 casos de intolerância religiosa registrados pelo país no Disque-100 em 2018 foi relatada nos estados de São Paulo (91), Rio de Janeiro (61), Bahia (24), Pernambuco (24) e Minas Gerais (23).  De janeiro a junho de 2019, houve 354 casos registrados pelo Disque-100, inclusive São Paulo (48), Rio de Janeiro (35), Minas Gerais (14), Goiás (9) e Bahia (9).  As estatísticas para o restante do ano não estavam disponíveis.

De acordo com uma pesquisa do Datafolha de dezembro de 2018, divulgada em janeiro, 26% dos entrevistados declararam ter sofrido alguma forma de discriminação religiosa, sendo a religião a terceira maior causa de discriminação, atrás da classe social e do local de residência, mas ainda maior que discriminação por gênero, raça ou cor e orientação sexual.

Em 18 de agosto, o jornal Agora São Paulo publicou os resultados de uma solicitação de informações mostrando que a polícia civil recebeu 562 denúncias de intolerância religiosa entre janeiro e abril, em comparação com 280 no mesmo período de 2018.  Quase metade dos casos, 246, resultou em lesão corporal, cuja pena é de um a seis meses de detenção ou multa.  Os dados da polícia civil não incluíam as multas efetivas impostas, mas o Agora São Paulo observou que, na prática, os agressores raramente são presos por tal crime.

Segundo a Secretaria de Igualdade Racial do Estado da Bahia, houve 35 casos de intolerância religiosa no estado de janeiro a agosto.  A Secretaria de Estado dos Direitos Humanos do Rio de Janeiro registrou 123 casos de intolerância religiosa de janeiro a junho.  Grupos religiosos afro-brasileiros tiveram o maior número de ocorrências, com 18% envolvendo praticantes de candomblé, 57% outras religiões afro-brasileiras e 1% de umbanda.  Os municípios da região metropolitana do estado registraram 55 por cento dos incidentes, seguidos por 32 por cento da Baixada Fluminense nos arredores da cidade do Rio de Janeiro e 12 por cento na parte norte do estado do Rio de Janeiro.

Houve vários relatos de vários grupos interreligiosos, inclusive Religiões pela Paz e Iniciativa das Religiões Unidas, trabalhando em várias religiões para promover a liberdade e a tolerância religiosa.  Em 14 de julho, centenas de membros de grupos religiosos participaram de uma caminhada pacífica para combater a intolerância religiosa em Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, Estado do Rio de Janeiro, onde traficantes cristãos evangélicos atacaram terreiros inúmeras vezes.  Em 16 de agosto, a ONG Associação Comunitária Alzira do Conforto realizou a 22ª Caminhada Azoany em Defesa da Liberdade religiosa em Salvador, Bahia.  Aproximadamente 2.500 seguidores de religiões afro-brasileiras se reuniram em prol da proteção da cultura e religião afro-brasileiras.

Em 15 de setembro, a Comissão de ONGs de Combate à Intolerância Religiosa organizou a 12ª Caminhada Anual em Defesa da Liberdade Religiosa na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro.  O evento atraiu centenas de participantes de diversas origens religiosas e não-religiosas, inclusive Islã, Judaísmo, Cristianismo, Budismo, Espiritualismo, Ateísmo, Candomblé e Umbanda, e enfatizou mensagens de respeito e amor mútuos.

Em Cabo de Santo Agostinho, Estado de Pernambuco, membros do Terreiro Ile Ase Sango Ayra Ibona organizaram uma procissão para homenagear a divindade religiosa Oxum e pedir tolerância religiosa.  A imprensa informou que o grupo caminhou até as margens do rio Pirapama em julho para oferecer flores, frutas e joias.  A caminhada ajudou a conscientizar as religiões afro-brasileiras, promover uma cultura de tolerância e incentivar o respeito.

Segundo a imprensa, vários comitês de liberdade religiosa dos capítulos estaduais da OAB participaram de eventos de apoio à liberdade religiosa.  Em 31 de maio, a OAB Contagem apoiou e participou do sexto desfile contra o racismo e a Intolerância no estado de Minas Gerais.  A OAB Paraíba realizou a Primeira Mesa Redonda sobre Intolerância Religiosa e Racismo em 31 de maio.  Em 24 de julho, a OAB Rio de Janeiro criou uma central telefônica para receber denúncias de intolerância religiosa.

Em abril e setembro, os representantes da embaixada contataram o coordenador de diversidade religiosa do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.  Representantes da Diretoria de Promoção e Educação dos Direitos Humanos discutiram o status do Comitê Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa e o empenho do governo em promover a tolerância religiosa.  Os representantes da embaixada promoveram a Reunião Ministerial para o Avanço da Liberdade Religiosa do Departamento de Estado e a importância de proteger a liberdade religiosa.

Em julho, representantes da embaixada se reuniram com representantes do DECRIN e discutiram um relatório do DECRIN documentando casos de intolerância religiosa no Distrito Federal.

A embaixada e os consulados indicaram Ivanir dos Santos, um ativista do Rio de Janeiro, acadêmico e líder religioso afro-brasileiro ao Prêmio Internacional de Liberdade Religiosa de 2019 do Departamento de Estado em homenagem a atores da sociedade civil que demonstraram um compromisso excepcional com o avanço da liberdade de religião ou crença.  Em julho, Santos foi selecionado como um dos cinco premiados na Reunião Ministerial para o Avanço da Liberdade Religiosa, em Washington-DC.  Segundo Ivanir, o prêmio fortaleceu seu trabalho, aumentando a conscientização da imprensa e reforçando sua credibilidade na sociedade civil como líder regional em questões de intolerância religiosa.  Após uma série de reuniões desde que recebeu seu prêmio, o consulado e Ivanir fizeram um diálogo interreligioso em um templo do Candomblé, no norte da cidade do Rio de Janeiro, em setembro, com a participação de representantes luteranos, de umbanda e candomblé.  Juntamente com o cônsul geral e outros representantes do consulado, Ivanir e um grupo diversificado de líderes religiosos descreveram a urgência de combater ameaças à liberdade religiosa no país e a importância do apoio dos EUA na conscientização.  Liderando várias centenas de participantes da 12ª Caminhada Anual em Defesa da Liberdade Religiosa na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, Ivanir atraiu atenção sem precedentes da imprensa e do governo.

Em abril, representantes da embaixada e do consulado se reuniram com representantes da Federação Israelense do Rio de Janeiro para discutir o antissemitismo no país.

Em maio, representantes da embaixada e do consulado se reuniram com representantes da Igreja de Jesus Cristo em sua sede nacional em São Paulo.

Em maio e agosto, representantes do consulado do Recife se reuniram com representantes da Federação Israelense de Pernambuco para discutir questões que afetam a comunidade judaica.  Líderes da federação compartilharam incidentes de intolerância religiosa e discutiram a história da comunidade judaica em Recife.

Autoridades do Consulado de São Paulo se reuniram com líderes cristãos evangélicos em julho para discutir o papel dos líderes religiosos na promoção da tolerância religiosa.

Em 26 de setembro, representantes do Consulado Geral no Rio de Janeiro se reuniram com Ivanir dos Santos e outros líderes religiosos afro-brasileiros durante uma visita a um terreiro de Candomblé no subúrbio do Rio, local sujeito a incidentes de intolerância religiosa.  Dos Santos solicitou que o consulado continuasse apoiando instituições religiosas afro-brasileiras e monitorando questões que afetam a liberdade religiosa no país.

Em outubro, um representante da embaixada se reuniu com um representante da Igreja Adventista do Sétimo Dia.  Eles discutiram os interesses da Igreja em promover o respeito pela liberdade religiosa e as oportunidades de diálogo interreligioso.

Em dezembro, a embaixada promoveu um diálogo interreligioso com sete representantes de seis organizações religiosas e interreligiosas para discutir o estado da liberdade religiosa no país.  Os participantes representaram uma seção transversal de crenças, inclusive cristãos evangélicos, protestantes, afrodescendentes e indígenas.  A discussão centrou-se nos principais desafios que afetam a liberdade religiosa, principalmente o medo que alguns participantes disseram sentir de um evangelismo intolerante vinculado a organizações criminosas.