Relatório sobre Direitos Humanos 2016 – Brasil

Prefácio do secretário

A promoção dos direitos humanos e da governança democrática é um elemento central da política externa americana. Esses valores formam uma base essencial de sociedades estáveis, seguras e funcionais. Defender os direitos humanos e a democracia não é apenas um imperativo moral, mas atende a um dos principais interesses dos Estados Unidos, que é tornar o mundo mais estável e seguro. Os Relatórios sobre Práticas de Direitos Humanos por País 2016 (Relatórios sobre Direitos Humanos) demonstram o compromisso inabalável dos Estados Unidos em promover a liberdade, a dignidade humana e a prosperidade global.

Este é o 41º ano da produção dos Relatórios sobre Direitos Humanos pelo Departamento de Estado. O Congresso dos Estados Unidos determinou a elaboração destes relatórios para fornecer aos formuladores de políticas um relato holístico e preciso das condições dos direitos humanos em quase 200 países e territórios do mundo, incluindo todos os Estados-membros das Nações Unidas e todos os países que recebem assistência externa dos EUA. Estes relatórios abrangem direitos civis, políticos e trabalhistas reconhecidos internacionalmente, conforme estabelecido na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em outros instrumentos internacionais.

Os Relatórios sobre Direitos Humanos refletem os esforços conjuntos de nossas embaixadas e consulados para reunir as informações mais precisas possíveis. Eles são elaborados por especialistas em direitos humanos das missões diplomáticas americanas no mundo, que analisam informações disponíveis de diversas fontes da sociedade civil e dos governos, entre outras. Estes relatórios representam milhares de horas de trabalho, uma vez que as equipes de todos os países coletam e analisam informações. O Departamento de Estado se esforça para elaborar estes relatórios com objetividade e uniformidade no que diz respeito a sua abrangência e qualidade.

Os Relatórios sobre Direitos Humanos são utilizados pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário dos EUA como um recurso para formular políticas e orientar decisões, fundamentando as interações diplomáticas e determinando a alocação de ajuda externa e assistência do setor de segurança. Os Relatórios sobre Direitos Humanos também são utilizados no mundo todo para embasar o trabalho de defensores de direitos humanos, legisladores, acadêmicos, empresas, instituições multilaterais e ONGs.

O Departamento de Estado espera que estes relatórios ajudem outros governos, líderes da sociedade civil, ativistas e pessoas físicas a refletir sobre a situação dos direitos humanos em seus respectivos países e a trabalhar para promover a responsabilização por violações e abusos.

Nossos valores são nossos interesses quando se trata de direitos humanos. A produção destes relatórios ressalta nosso compromisso com a liberdade, a democracia e os direitos humanos garantidos a todas as pessoas do mundo.

Entrego neste ato os Relatórios sobre Práticas de Direitos Humanos por País 2016 do Departamento de Estado ao Congresso dos Estados Unidos.

Rex W. Tillerson
Secretário de Estado

SUMÁRIO EXECUTIVO

O Brasil é uma república constitucional e multipartidária. Em 2014, os eleitores reelegeram Dilma Rousseff para presidente em eleições amplamente consideradas livres e justas. Em 31 de agosto, Dilma sofreu impeachment, e o vice-presidente, Michel Temer, assumiu a Presidência conforme determinado pela Constituição.

As autoridades civis algumas vezes não mantiveram o controle efetivo sobre as forças de segurança.

Uso excessivo da força e execuções ilegais pelas polícias estaduais, condições carcerárias precárias e às vezes ameaçadoras à vida em algumas prisões e corrupção estiveram entre os abusos mais significativos contra os direitos humanos.

Outros problemas de direitos humanos incluíram espancamentos, abusos e tortura de detentos e presos pela polícia e pelas forças de segurança dos presídios; detenção prolongada de pessoas que aguardam julgamento e atrasos excessivos de julgamentos; censura judicial da mídia; violência e discriminação contra mulheres e meninas; violência contra crianças, inclusive abuso sexual; tráfico sexual, inclusive de crianças; conflitos sociais entre comunidades indígenas e proprietários de terra levando ocasionalmente à violência; discriminação contra índios e minorias; violência e discriminação social contra lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexuais; violência contra ambientalistas e trabalhadores rurais; situações de exploração do trabalho, inclusive trabalho forçado e trabalho infantil na economia informal e em partes da economia formal; e aplicação inadequada das leis trabalhistas.

O governo processou autoridades que cometeram abusos; no entanto, o processo judicial ineficiente atrasou a aplicação da justiça para violadores e também para sobreviventes.

Seção 1. Respeito à integridade da pessoa, incluindo a defesa contra:

 

a. Privação arbitrária da vida e outros assassinatos ilegais ou por motivação política

Não houve relatos de que o governo federal ou seus agentes tenham cometido assassinatos por motivação política, mas execuções ilegais foram cometidas pelas polícias estaduais. Em alguns casos, a polícia empregou força indiscriminada. Foi difícil determinar a extensão do problema, devido à ausência de números abrangentes e confiáveis sobre assassinatos ilegais cometidos pela polícia. Estatísticas oficiais mostram que a polícia mata um grande número de civis (legal ou ilegalmente) em conflitos todos os anos. Por exemplo, o Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, entidade do governo estadual, informou que de janeiro a julho a polícia matou 473 civis em “atos de resistência” (similares a resistir à prisão) no estado do Rio de Janeiro. A maioria das mortes ocorreu durante operações policiais contra traficantes de drogas nas cerca de 760 favelas da cidade do Rio de Janeiro, onde vive um número estimado de 1,4 milhão de pessoas. Um número desproporcional de vítimas foi de afro-brasileiros com menos de 25 anos. Organizações não governamentais (ONGs) do Rio de Janeiro questionaram se todas as vítimas de fato resistiram à prisão, alegando que a polícia continuou a empregar métodos repressivos. Em abril, a polícia realizou uma operação em Acari, favela na cidade do Rio de Janeiro, que resultou na morte de cinco civis. Relatos oficiais mostraram que as mortes ocorreram durante intenso tiroteio, mas moradores da comunidade afirmaram que a polícia executou as vítimas sumariamente. Os moradores também relataram problemas de uso excessivo da força pelos policiais durante a operação. Em novembro o caso ainda estava sendo investigado. O relatório da Anistia Internacional Um Legado de Violência – Homicídios Praticados pela Polícia e Repressão a Protestos na Olimpíada Rio 2016 revelou que ocorreram operações policiais violentas durante os Jogos Olímpicos (5 a 21 de agosto) em diversas comunidades pobres do Rio de Janeiro, resultando na morte de pelo menos oito pessoas. Em 11 de agosto, um jovem de 19 anos foi morto durante operação conjunta das Polícias Civil e Militar, do Exército e da Força de Segurança Nacional na favela do Complexo da Maré. No mesmo dia, policiais do Batalhão de Choque mataram dois adolescentes de 14 e 15 anos e um jovem de 22 na Favela Bandeira 2, no bairro de Del Castilho. Em 15 de agosto, policiais da Unidade de Polícia Pacificadora mataram um homem na Favela do Cantagalo, em Ipanema. No dia seguinte, policiais civis mataram três homens durante operação na Favela do Complexo da Maré.

Em fevereiro, nove policiais do grupo de patrulhamento especial da Polícia Militar do estado da Bahia foram denunciados por envolvimento na morte de 12 jovens negros no Cabula, bairro da capital Salvador. Relatórios da polícia e da autópsia indicaram que as vítimas estavam desarmadas e não ofereceram resistência. No entanto, em julho, a juíza Marivalda Almeida Moutinho absolveu os nove policiais de todas as acusações, determinando que agiram em legítima defesa.

b. Desaparecimentos

Não houve relatos de desaparecimentos por motivação política.

c. Tortura e outros tratamentos ou punições cruéis, desumanos ou degradantes

A Constituição proíbe esse tipo de tratamento e prevê penalidades legais severas para quem o praticar. Houve, no entanto, casos de tratamento degradante como os documentados por Juan Méndez, relator especial da ONU sobre tortura e outros tratamentos ou punições cruéis, desumanos ou degradantes, que visitou o país em agosto de 2015 e publicou suas conclusões em janeiro. Depoimentos confiáveis de detentos – mulheres, homens, meninas e meninos escolhidos aleatoriamente em vários centros de detenção – indicaram o uso frequente de tortura e maus-tratos, variando nos métodos e na gravidade da dor e do sofrimento infligidos. Os incidentes ocorreram durante a prisão e o interrogatório feitos pela polícia e também enquanto os detentos estavam sob a custódia de agentes penitenciários. Os detentos relataram que houve casos de chutes, espancamentos (às vezes com paus e cassetetes) e asfixia cometidos por policiais e agentes penitenciários. Os detentos também informaram que os policiais e os agentes penitenciários usaram armas Taser, spray de pimenta, gás lacrimogêneo, tiros de festim e balas de borracha, além de uma profusão de insultos e ameaças verbais.

Condições das prisões e dos centros de detenção

As condições em muitas prisões se mostraram precárias e às vezes ameaçadoras à vida, principalmente devido à superlotação. Abusos cometidos por carcereiros, inclusive abuso sexual, continuaram ocorrendo em muitos estabelecimentos, e as condições precárias de trabalho e os baixos salários dos carcereiros estimularam a corrupção.

Condições físicas: a superlotação endêmica foi um problema. Segundo o Ministério da Justiça e Cidadania, em novembro a população carcerária era de 711.463 presos (incluindo prisões domiciliares); a capacidade oficial do sistema penitenciário era de 376.669 presos. Segundo a Pastoral Carcerária da Igreja Católica, em alguns estados houve casos de mulheres às vezes mantidas com homens, embora em celas separadas. Presos que cometeram crimes menores foram com frequência mantidos junto com assassinos e outros criminosos violentos. As autoridades tentaram manter os detentos que aguardavam julgamento separados dos presos condenados, mas a falta de espaço muitas vezes fez com que criminosos condenados fossem mantidos em acomodações de detenção para os que aguardam julgamento. Muitas prisões, inclusive no Distrito Federal, tentaram separar os infratores violentos dos não violentos e manter traficantes de drogas condenados em uma ala separada do resto da população carcerária. Diversas fontes relataram a existência de adolescentes presos com adultos em condições precárias e de superlotação. Em muitos centros de detenção juvenil, o número de detentos superou enormemente a capacidade.

Houve violência desenfreada em várias instituições prisionais do Nordeste. Além da superlotação, a má administração do sistema prisional, a presença de gangues e a corrupção contribuíram para a violência no sistema penitenciário. Em julho, organizações criminosas realizaram motins e atos violentos em diversas instituições prisionais no estado do Rio Grande do Norte depois que o governo estadual anunciou que instalaria bloqueadores de celular nesses estabelecimentos. As autoridades destacaram mais de mil soldados do Exército depois que 107 presos fugiram e incendiaram vários ônibus públicos. Em outubro, confrontos entre facções criminosas rivais mataram pelo menos 18 detentos em duas penitenciárias nos estados de Roraima e Rondônia, segundo reportagens da imprensa.

A imprensa noticiou diversas rebeliões e fugas no Complexo Prisional do Curado no estado de Pernambuco. Em junho, juízes da Corte Interamericana de Direitos Humanos visitaram o Complexo do Curado (antigo Presídio Anibal Bruno) em razão de uma ação movida contra o estado de Pernambuco por supostas violações dos direitos humanos. Como parte do processo da Corte Interamericana, a Human Rights Watch e outras ONGs citaram condições sanitárias impróprias. Os índices de HIV e tuberculose nas prisões foram muito mais altos do que os índices na população em geral. A prevalência da tuberculose nas prisões de Pernambuco teria sido 37 vezes maior do que na população brasileira em geral.

Administração: presos e detentos puderam receber visitas; no entanto, observadores dos direitos humanos relataram que alguns visitantes reclamaram de procedimentos de revista que às vezes incluíram exames físicos invasivos e sem condições sanitárias. Ouvidorias estaduais e a Secretaria de Direitos Humanos, do governo federal, monitoraram as condições de prisões e centros de detenção e investigaram alegações de condições desumanas.

Monitoramento independente: o governo permitiu o monitoramento por observadores independentes não governamentais, entre eles, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, as Nações Unidas e a Organização dos Estados Americanos.

Melhorias: no Complexo de Pedrinhas, no estado do Maranhão, as autoridades reduziram o nível de violência ao encarcerar líderes de facções rivais em unidades separadas e profissionalizar os agentes penitenciários, que passaram de contratados do setor privado a funcionários públicos.

d. Prisão ou detenção arbitrária

A lei proíbe prisões e detenções arbitrárias e estabelece que as prisões devem ser restritas àquelas efetuadas em flagrante ou por ordem de autoridade judicial; no entanto, a polícia às vezes não respeitou essa proibição.

Papel da polícia e do aparato de segurança

A Polícia Federal, vinculada ao Ministério da Justiça e Cidadania, é uma instituição pequena, essencialmente investigativa e tem papel menor na aplicação rotineira da lei. A maior parte das forças policiais encontra-se sob o controle dos estados. Há dois efetivos distintos nas forças das polícias estaduais: a Polícia Civil, com função investigativa, e a Polícia Militar, responsável pela manutenção da lei e da ordem. Apesar do nome, a Polícia Militar não se reporta ao Ministério da Defesa. A legislação dispõe que a competência para julgar os policiais militares dos estados é da Justiça Militar, salvo nos casos de policiais acusados de “crimes dolosos contra a vida”, especialmente homicídio. Quase sempre a polícia foi responsável pela investigação das acusações de tortura e uso excessivo da força praticados por integrantes de seus quadros; no entanto, as investigações independentes aumentaram. A demora dos tribunais da Justiça Militar levou à prescrição de muitos casos.

As autoridades civis de modo geral mantiveram o controle efetivo das forças de segurança, e o governo tem mecanismos em vigor para investigar e punir abusos e corrupção; no entanto, a impunidade e a falta de prestação de contas das forças de segurança continuaram sendo um problema.

Nas favelas do Rio de Janeiro, as chamadas milícias, compostas por policiais fora de serviço e ex-policiais, quase sempre assumiram a responsabilidade do policiamento. Muitas milícias intimidaram moradores e participaram de atividades ilegais, como extorsão de dinheiro em troca de proteção e oferta de serviços de utilidade pública clandestinos.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, os cursos de direitos humanos foram um componente obrigatório da capacitação dos policiais militares em início de carreira. Os policiais das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que atuam no Programa de Pacificação das Favelas do estado, receberam treinamento adicional em direitos humanos. Durante o ano, a Polícia Militar do Rio de Janeiro forneceu treinamento em direitos humanos para 120 policiais de UPPs.

Procedimentos de prisão e tratamento de detentos

A menos que um suspeito seja pego em flagrante, a prisão não pode ser efetuada sem mandado emitido por autoridade judiciária. As autoridades devem informar os suspeitos dos seus direitos no momento da prisão ou antes de os levarem sob custódia para interrogatório. A lei proíbe o uso da força durante a prisão, a menos que o suspeito tente escapar ou resista à prisão. Segundo observadores de direitos humanos, alguns detidos reclamaram de abusos físicos ao serem levados sob custódia.

As autoridades, de modo geral, respeitaram o direito constitucional de pronta decisão judicial sobre a legalidade da detenção. Os detidos foram informados prontamente sobre as acusações feitas contra eles. A lei permite a detenção provisória por até cinco dias em condições específicas durante a investigação, mas o juiz pode prolongar esse período. Um juiz pode também ordenar detenção temporária por mais cinco dias para processamento. A detenção preventiva por um período inicial de 15 dias é permitida se houver indícios de que o suspeito possa sair da região. A lei não estabelece um período máximo para a detenção dos que aguardam julgamento, o que é decidido caso a caso. Se os detidos forem condenados, o período de detenção anterior ao julgamento é subtraído da pena. Os réus presos em flagrante devem ser acusados em até 30 dias a partir da data da prisão. Os demais réus devem ser acusados em até 45 dias, embora esse período possa ser prorrogado. Em muitos casos, o período para a acusação dos réus precisou ser prorrogado devido aos atrasos da Justiça. Houve possibilidade de pagamento de fiança para a maioria dos crimes, e os réus acusados de crime, exceto os mais graves, têm direito a audiência para fixar a fiança. As autoridades carcerárias em geral permitiram aos detidos acesso imediato a um advogado. Detidos sem recursos próprios têm direito a um advogado do Estado. Os detidos também tiveram permissão para entrar em contato imediatamente com seus familiares.

Detenção de quem aguarda julgamento: segundo o Conselho Nacional de Justiça, as prisões mantiveram aproximadamente 250 mil pessoas em detenção preventiva.

Possibilidade de o detido questionar a legalidade da detenção na Justiça: as pessoas presas ou detidas podem questionar na Justiça a base legal de sua detenção e obter pronta soltura e indenização se constatado que houve detenção ilegal.

e. Negação de julgamento público imparcial

A Constituição prevê um Judiciário independente, e o governo de modo geral respeitou a independência do Judiciário. ONGs locais, no entanto, mencionaram que a corrupção no Judiciário, em especial em âmbito municipal e estadual, continuou sendo motivo de preocupação.

Procedimentos de julgamento

A Constituição prevê o direito a um julgamento público imparcial, e um Judiciário independente em geral fez cumprir esse direito, embora ONGs tenham informado que em algumas regiões rurais — em especial em casos envolvendo ativistas do direito à terra — notou-se que policiais, promotores e o Judiciário estão mais sujeitos a influências externas, inclusive por medo de represálias. Investigações, ações penais e julgamentos nesses casos foram quase sempre postergados.

Após a prisão, o juiz dá vistas ao processo, determina se procede e o encaminha a um promotor de Justiça estadual que decide se efetua a denúncia. Tribunais do júri julgam casos que envolvem crimes dolosos contra a vida; os juízes têm competência para julgar aqueles acusados de crimes menores. O réu goza de presunção de inocência e tem direito de estar presente em seu julgamento; ser prontamente informado das acusações; de não ser obrigado a depor ou confessar culpa; de acesso a provas mantidas pelo governo; de acareação e de fazer perguntas às testemunhas da acusação; de apresentar suas próprias testemunhas e provas; e também de recorrer das sentenças. A lei estende esses direitos a todos os réus. Os réus em geral tiveram tempo suficiente e instalações adequadas para preparar sua defesa, mas não tiveram direito a interpretação gratuita.

Embora a lei determine que os julgamentos sejam realizados dentro de um prazo determinado, há milhões de processos atrasados em tribunais estaduais, federais e de recursos, e os tribunais normalmente levam muitos anos para concluí-los. Para reduzir os atrasos, tribunais estaduais e federais frequentemente extinguem processos antigos sem julgamento. Embora a lei preveja o direito a um advogado de defesa, o Ministério da Justiça e Cidadania afirmou que muitos presos não dispõem de recursos para a contratação de advogado. Nesses casos, a Justiça deve constituir um defensor público ou um advogado particular às expensas públicas, mas o déficit de pessoal continuou em todos os estados.

Presos e detentos políticos

Não houve relatos de presos ou detentos políticos.

Procedimentos e recursos judiciais civis

Os cidadãos podem entrar com ações judiciais na Justiça por violações dos direitos humanos. Embora o sistema judiciário preveja um Judiciário Civil independente, os tribunais estiveram sobrecarregados com atrasos e, às vezes, ficaram sujeitos a corrupção, influências políticas e intimidações indiretas. Casos envolvendo violações dos direitos humanos de uma pessoa podem ser encaminhados por meio de petições de pessoas físicas ou organizações à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que por sua vez pode encaminhar o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Restituição de propriedade

A lei determina indenização ou compensação proporcional e oportuna nos casos em que o governo desapropria propriedades privadas. ONGs do Rio de Janeiro, no entanto, informaram que os direitos de moradores de comunidades populares nem sempre foram respeitados ao serem realocados pelas autoridades municipais do Rio de Janeiro como parte dos esforços para melhorar a mobilidade e a segurança urbanas durante os preparativos para a Olimpíada realizada na cidade. Segundo ONGs locais, as autoridades fizeram uso de leis de domínio eminente para realocar aproximadamente 20 mil famílias, a maioria delas sem título legal da propriedade que ocupavam. Ativistas e moradores argumentaram que muitas dessas remoções eram desnecessárias e foram realizadas principalmente para aumentar o valor das propriedades. As remoções realizadas na Vila Autódromo, ao lado do Parque Olímpico, foram citadas como exemplos desse tipo de remoção. Alguns moradores informaram ter sido pressionados a aceitar indenização insuficiente por sua propriedade.

f. Interferência arbitrária ou ilegal na privacidade, na família, no lar ou na correspondência

Embora a lei e a Constituição proíbam essas práticas, houve relatos de ONGs de que a polícia eventualmente efetuou buscas sem mandado judicial. Grupos de direitos humanos, outras ONGs e a mídia relataram incidentes de buscas abusivas da polícia em bairros pobres. Durante essas operações, a polícia deteve e interrogou pessoas e revistou carros, residências e estabelecimentos comerciais sem mandado judicial.

Seção 2. Respeito às liberdades civis, incluindo:

 

a. Liberdade de expressão e de imprensa

A Constituição e a lei garantem a liberdade de expressão e de imprensa, e o governo em geral respeitou esses direitos. A mídia independente foi ativa e expressou ampla variedade de opiniões com restrições mínimas; mas criminosos não ligados ao governo submeteram jornalistas a atos de violência devido às suas atividades profissionais. Apesar de leis federais proibirem a censura judicial por motivação política, alguns tribunais locais fizeram uso da censura judicial. ONGs destacaram casos de violência contra jornalistas. A maioria foi cometida por manifestantes ou baderneiros no contexto de grandes manifestações, mas em alguns casos as forças de segurança feriram jornalistas durante operações para controlar multidões.

Violência e perseguição: jornalistas foram algumas vezes submetidos a perseguição e ataques físicos em função de suas reportagens. Segundo a Repórteres sem Fronteiras, quatro jornalistas foram mortos no país até setembro. Em 16 de agosto, Maurício Campos Rosa, dono do jornal O Grito, foi morto em Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais. Segundo uma rádio local, o motivo provavelmente estava relacionado com as investigações jornalísticas de Rosa sobre corrupção envolvendo vereadores da cidade e uma cooperativa responsável pela coleta de lixo.

Em fevereiro, o jornal Gazeta do Povo, do estado do Paraná, publicou uma lista de “supersalários” contendo os nomes de juízes, promotores públicos e servidores públicos civis que recebiam mais do que o teto permitido por lei depois de incluídos os benefícios no cálculo. Juízes e promotores públicos do Paraná responderam com a abertura de 37 ações judiciais contra o jornal e seus funcionários. Em julho, a ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa Weber suspendeu as ações até o julgamento do mérito dos processos. A ONG Comitê para a Proteção dos Jornalistas denunciou as ações como “assédio judicial”.

Liberdade na internet

O governo não restringiu nem interrompeu o acesso à internet e não censurou de maneira sistemática o conteúdo on-line, tampouco houve relatos confiáveis de que o governo tenha monitorado a comunicação on-line privada sem a devida autorização legal.

Na teoria, o Marco Civil da Internet de 2014 – considerado uma “declaração de direitos” da internet – consagra a neutralidade da rede e a liberdade de expressão on-line e prevê a inviolabilidade e o sigilo das comunicações on-line dos usuários, permitindo exceções somente com mandado judicial. No entanto, várias determinações legais e judiciais citando o Marco Civil tiveram potencial para ameaçar a liberdade de expressão na internet. O discurso anônimo está explicitamente excluído de proteção constitucional, o que significou pouca proteção da privacidade para quem usou a internet anonimamente por meio de pseudônimo. Policiais e promotores podem obter informações de acordo com três leis principais: Lei de Interceptação Telefônica, Lei de Sigilo Bancário e Lei de Lavagem de Dinheiro.

Pessoas físicas e órgãos oficiais entraram com ações contra provedores de serviços de internet e provedores de plataformas de mídias sociais on-line, como Google e Facebook, responsabilizando-os pelo conteúdo postado ou fornecido por usuários das plataformas. Durante o ano, houve pelo menos três casos de bloqueio temporário de aplicativos de mensagens, como o WhatsApp, aos usuários de todo o país devido a decisões judiciais relacionadas com investigações criminais. Um ministro do Supremo Tribunal Federal suspendeu o bloqueio do WhatsApp em algumas horas, considerando-o uma violação do direito constitucional à liberdade de expressão.

A legislação eleitoral regula a atividade das campanhas políticas na internet. A lei proíbe a propaganda política paga on-line e na mídia tradicional. Nos três meses que antecedem uma eleição, a lei também proíbe a mídia on-line e tradicional de promover candidatos e distribuir conteúdo que ridicularize ou possa ofender algum candidato.

Segundo o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), 51% dos domicílios tiveram acesso à internet em 2015 e 58% da população utilizou a internet. O governo promoveu a inclusão digital fornecendo acesso gratuito à internet via satélite para áreas remotas; acesso à banda larga para governos, escolas e centros de saúde municipais; computadores a determinadas populações; e outros tipos de assistência para comunidades vulneráveis.

Liberdade acadêmica e eventos culturais

Não houve restrições do governo à liberdade acadêmica nem a eventos culturais.

b. Liberdade de reunião e associação pacíficas

A lei garante a liberdade de reunião e associação, e o governo de modo geral respeitou tal direito.

Liberdade de reunião

O governo de modo geral respeitou os direitos de liberdade de reunião, mas a polícia ocasionalmente interveio em manifestações de cidadãos. Em janeiro, na cidade de São Paulo, por exemplo, a Polícia Militar fez uso de bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo para impedir os manifestantes do Movimento Passe Livre (MPL), que se opunham a aumentos nas tarifas de ônibus, trem e metrô, de se manifestar em uma das principais vias da cidade. Autoridades locais afirmaram que os líderes do MPL não informaram à polícia sobre a rota planejada da manifestação e, portanto, os policiais agiram para impedir que os manifestantes destruíssem propriedades, como bancos que foram depredados em protestos anteriores. ONGs informaram que tanto a polícia quanto o MPL contribuíram para a intensificação dos eventos. Alguns observaram que a polícia não foi clara ao informar os manifestantes com que antecedência deveriam notificar sobre a realização do protesto; outros observaram que, durante as manifestações, o MPL tolerou violência cometida por grupos não ligados ao movimento.

Houve vários protestos nacionais de grande escala em março, abril e agosto pedindo o impeachment da presidente Dilma Rousseff e o fim da corrupção. A polícia não registrou nenhum incidente de segurança grave durante esses protestos.

Liberdade de associação

A lei garante esse direito, que de modo geral foi respeitado pelo governo.

c. Liberdade de religião

Consulte o Relatório sobre Liberdade Religiosa Internacional do Departamento de Estado em www.state.gov/religiousfreedomreport/.

d. Liberdade de locomoção, pessoas deslocadas internamente, proteção a refugiados e apátridas

A Constituição garante liberdade de locomoção no território nacional, de viagem ao exterior, de emigração e repatriação, e o governo, de modo geral, respeitou esses direitos. O Comitê Nacional para os Refugiados cooperou com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados e outras organizações humanitárias para dar proteção e assistência a refugiados, solicitantes de asilo e outras pessoas que são motivo de preocupação.

Proteção de refugiados

Acesso a asilo: a legislação dispõe sobre a concessão de asilo ou condição de refugiado, e o governo estabeleceu um sistema de concessão de proteção a refugiados. Por lei, os refugiados recebem documentos oficiais, acesso à proteção legal e acesso aos serviços públicos.

Proteção temporária: o governo prestou assistência a imigrantes haitianos que entraram no país com a esperança de conseguir emprego e fugir da situação econômica do Haiti. Para reduzir o número de haitianos que procuram entrar no Brasil por rotas de migração irregulares, o governo prorrogou até outubro de 2017 sua política de emissão de vistos humanitários em sua embaixada no Haiti. O visto permite aos seus detentores receber assistência médica e social, além do direito de trabalhar. Segundo o governo, 85 mil imigrantes haitianos imigraram para o país desde 2012.

Seção 3. Liberdade de participação no processo político

 

A lei assegura aos cidadãos o direito de escolher seu governo em eleições periódicas livres e justas, realizadas por voto secreto e com base no sufrágio universal e igualitário.

Eleições e participação política

Eleições recentes: em eleições gerais realizadas em 2014, Dilma Rousseff foi eleita para um segundo mandato presidencial de quatro anos. Observadores consideraram as eleições livres e justas. Em 31 de agosto, o Congresso aprovou o impeachment de Dilma por violação da leis orçamentária e de responsabilidade fiscal, e o vice-presidente, Michel Temer, assumiu a Presidência conforme determinado pela Constituição.

Em outubro, os eleitores participaram de eleições municipais em todo o país, amplamente consideradas livres e justas. No período que antecedeu às eleições municipais, no entanto, o Tribunal Superior Eleitoral e a Polícia Federal informaram que até 20 candidatos ou políticos haviam sido mortos em atos de violência atribuídos a redes do crime organizado. Quinze mortes ocorreram no estado do Rio de Janeiro, e um incidente de grande repercussão ocorreu no estado de Goiás, quando o candidato a prefeito José Gomes da Rocha foi morto a tiros enquanto fazia campanha. Em resposta ao aumento da violência, o governo federal destacou dezenas de milhares de soldados para mais de 400 municípios a fim de aumentar a segurança e proteger o transporte das urnas e as seções eleitorais. Não houve relatos de violência no dia da eleição.

Participação de mulheres e minorias: nenhuma lei limita a participação das mulheres e das minorias no processo político. Segundo a Secretaria de Políticas para as Mulheres, as mulheres constituem 9% das legisladoras em âmbito nacional no Congresso, e pessoas de descendência africana, 8,5%.

Seção 4. Corrupção e falta de transparência no governo

 

A lei prevê sanções penais para funcionários públicos condenados por corrupção e determina sanções civis para casos de corrupção cometidos por brasileiros ou entidades brasileiras no exterior, mas o governo nem sempre aplicou a lei de maneira efetiva. Houve vários relatos de corrupção no governo, e atrasos nos processos judiciais contra os acusados de corrupção quase sempre resultaram em impunidade de fato para os responsáveis. Em resposta a uma série de investigações de corrupção de alta repercussão, milhões de cidadãos em todo o país foram às ruas durante o ano para protestar contra a corrupção.

Corrupção: a investigação do escândalo de desvio de fundos da petrolífera estatal Petrobras (Operação Lava Jato), iniciada em 2014, continuou e resultou em prisões e condenações de lavadores de dinheiro e grandes empreiteiros, bem como na investigação, no indiciamento e na condenação de políticos de toda a classe política. Informações obtidas por meio de colaboração e acordos de delação premiada com suspeitos resultaram em uma rede ampliada de novas investigações. Em setembro, investigadores federais executaram mais de cem mandados de busca e apreensão e congelaram R$ 8,75 bilhões em quatro dos maiores fundos de pensão na Operação Greenfield. Também houve investigações paralelas de corrupção em âmbito federal e estadual que indicaram maior escrutínio da corrupção, variando de entidades paraestatais federais a contratos com governos locais.

Declaração financeira: as autoridades públicas estão sujeitas a leis que estabelecem a obrigatoriedade da declaração de bens e rendas, e as autoridades de modo geral cumpriram essas disposições. As declarações de bens não são divulgadas publicamente, mas as informações sobre salários e pagamentos dos funcionários federais são publicadas on-line e podem ser pesquisadas por nome.

Acesso público à informação: a lei prevê acesso público a informações não confidenciais do governo. A lista de exceções é suficientemente reduzida e inclui informações pessoais; informações que afetam a segurança ou a saúde pública, a segurança nacional ou as relações internacionais; e informações militares e de inteligência confidenciais. As únicas taxas cobradas são os custos de impressão, cópia e postagem da documentação. O governo tem 20 dias para responder às solicitações e pode pedir mais 10 dias, com o máximo de 30 dias após o recebimento da solicitação.

Seção 5. Postura do governo referente a investigações internacionais e não governamentais de denúncias de violações de direitos humanos

 

Vários grupos de direitos humanos nacionais e internacionais atuaram em geral sem restrições do governo e investigaram e publicaram suas constatações sobre casos de direitos humanos. As autoridades federais colaboraram e se mostraram receptivas à opinião desses grupos. Autoridades federais e estaduais em muitos casos solicitaram ajuda e cooperação de ONGs nacionais e internacionais para tratar de questões relativas aos direitos humanos.

Órgãos governamentais de direitos humanos: em maio, uma reforma ministerial resultou na reestruturação da composição de vários ministérios federais. Foi criado o Ministério da Justiça e Cidadania, que absorveu as competências da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, a Secretaria Especial de Direitos Humanos e a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Organizações de direitos humanos locais criticaram a reforma, uma vez que várias dessas secretarias anteriormente tinham status de ministério e mais autonomia.

Tanto a Câmara dos Deputados quanto o Senado contam com comissões de direitos humanos que atuaram de forma independente e participaram de várias atividades em todo o país em conjunto com organizações nacionais e internacionais de direitos humanos. A maioria dos estados tem ouvidorias de polícia, mas sua eficácia variou, dependendo de fatores como recursos financeiros disponíveis e pressão política externa.

O Conselho Nacional de Direitos Humanos, composto por 22 membros – 11 de órgãos governamentais e 11 da sociedade civil – reuniu-se periodicamente. Entre outros conselhos que utilizam esse modelo misto de membros do governo e da sociedade civil estão o Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT, o Conselho Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa, o Conselho Nacional de Políticas de Igualdade Racial, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e o Comitê Nacional para os Refugiados.

Seção 6. Discriminação, abusos sociais e tráfico de pessoas

 

Mulheres

Estupro e violência doméstica: a lei criminaliza o estupro, inclusive estupro do cônjuge. A violência cometida por parceiro íntimo continuou disseminada e subnotificada às autoridades, por medo de retaliação, do aumento da violência e do estigma social. Pessoas condenadas pela morte de uma mulher ou menina em casos de violência doméstica podem ser condenadas a penas de prisão entre 12 e 30 anos. Sentenças mais longas estão previstas para o assassinato de grávidas, menores de 14 anos, mulheres e meninas com deficiência ou maiores de 60 anos. Segundo o Observatório Judicial da Violência contra a Mulher do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, de janeiro a junho 58 mil novos casos de violência contra mulheres foram levados a julgamento no estado. Em maio, um caso de grande repercussão de estupro de uma adolescente por um grupo de 33 homens deu início a um debate sobre a prevalência da violência de gênero. Segundo a ONU Mulheres e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, em 2013 uma média de 13 mulheres foi morta por dia no país devido a esse tipo de violência.

O governo federal manteve em funcionamento uma central de atendimento gratuito à mulher em todo o território nacional para denúncias de casos de violência cometida por parceiro íntimo (Ligue 180). A central de atendimento tem autoridade para mobilizar unidades da Polícia Militar para responder a essas denúncias e fazer o acompanhamento dos casos.

As secretarias estaduais de Segurança Pública contaram com Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher, e os crimes contra as mulheres continuaram um problema significativo. As delegacias especializadas ofereceram aconselhamento psicológico, abrigo temporário e tratamento hospitalar às vítimas de violência cometida por parceiro íntimo, inclusive estupro, além de assistência nos processos penais por meio de investigação dos incidentes e encaminhamento de provas aos tribunais. Também foram mantidos em funcionamento pelos governos estaduais e municipais centros de referência e abrigos temporários para mulheres. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que 8% dos municípios tinham um espaço destinado à proteção e ao atendimento das vítimas de violência de gênero.

Nos casos em que a mulher sofre agressão física, sexual ou psicológica, a lei exige que os centros de saúde comuniquem o fato à polícia para coleta de provas e depoimentos, caso a vítima decida entrar com ação judicial.

Assédio sexual: o assédio sexual é crime, punível com até dois anos de prisão no caso de condenação. A lei proíbe investidas sexuais em locais de trabalho ou instituições educacionais, bem como entre prestadores de serviços ou clientes. No local de trabalho, a lei aplica-se apenas em situações hierárquicas, nas quais o agressor tem posição ou cargo mais elevado que o da vítima. ONGs informaram que o assédio sexual continuou sendo motivo de grande preocupação, em particular porque 70% da vítimas eram menores.

Direitos reprodutivos: casais e indivíduos têm o direito de decidir o número de filhos que desejam ter, o intervalo entre eles e quando tê-los; controlar sua saúde reprodutiva; e ter acesso a informações e meios para tomar essa decisão, sem discriminação, coerção ou violência.

Discriminação: a lei prevê o mesmo status legal e os mesmos direitos para mulheres e homens. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em 2014 as mulheres receberam 70% do que os homens receberam para o mesmo trabalho.

Crianças

Registro de nascimentos: a cidadania é obtida pelo nascimento no país ou de um dos pais. O Conselho Nacional de Justiça, em parceria com a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SDH), agiu para reduzir o número de crianças sem certidão de nascimento registrando os recém-nascidos nas maternidades. O Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural ofereceu assistência na obtenção de certidão de nascimento e outros documentos para crianças nascidas em áreas rurais. Em dezembro de 2015, o governo federal anunciou que a porcentagem de crianças sem certidão de nascimento havia caído para 1%.

Abuso contra crianças: o abuso e a negligência contra crianças e adolescentes foram problemas. Crianças e adolescentes foram vítimas de estupro e assédio, inclusive com meninas engravidadas por familiares. A SDH supervisiona um programa que definiu estratégias nacionais para combater o abuso sexual de crianças e melhores práticas para o tratamento das vítimas. O governo manteve um programa de proteção de crianças e adolescentes. Sessenta por cento dos jovens do programa haviam recebido ameaças de morte por envolvimento com o tráfico de drogas, e a maioria entrou no programa acompanhada por um ou mais familiares. O programa ofereceu aconselhamento psicológico e cursos técnicos para a reinserção desses jovens em situações comunitárias estáveis.

Casamentos prematuros e forçados: a idade mínima legal para o casamento é 18 anos (16 com o consentimento dos pais ou de um representante legal). Segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância, 11% das mulheres entre 20 e 24 anos estavam casadas antes dos 15, e 36% das mulheres entre 20 e 24 anos casaram antes dos 18.

Exploração sexual de crianças: a exploração sexual de crianças, adolescentes e vulneráveis é punível com penas de prisão de quatro a dez anos em caso de condenação. A lei define exploração sexual infantil a prostituição de crianças, atividades sexuais, produção de pornografia infantil e espetáculos sexuais públicos ou privados. A lei estabelece 14 anos como a idade mínima para a relação sexual consensual, com penas para a condenação por estupro variando entre 8 e 15 anos de prisão.

Embora não haja legislação específica sobre turismo sexual infantil, esse crime é passível de punição com base em outras infrações penais. O país foi destino para o turismo sexual infantil. Várias das principais cidades litorâneas do Nordeste foram destino turístico para o tráfico de crianças e adolescentes com o propósito de exploração sexual comercial. Além disso, reportagens indicaram que a exploração sexual de crianças e adolescentes aumentou no entorno de grandes projetos de construção.

A lei criminaliza a pornografia infantil. A pena por condenação por posse de pornografia infantil é de até quatro anos de prisão e multa.

O Ministério do Turismo promoveu seu código de conduta para evitar a exploração sexual comercial de crianças no setor de turismo. A Polícia Rodoviária Federal e a Organização Internacional do Trabalho divulgaram materiais de conscientização em locais como postos de gasolina, bares, restaurantes, motéis e casas noturnas ao longo de rodovias consideradas áreas de exploração sexual de crianças e adolescentes.

Sequestro internacional de crianças: o país é signatário da Convenção de Haia sobre Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, de 1980. Veja o Relatório Anual sobre Sequestro Internacional de Crianças por um dos Genitores elaborado pelo Departamento de Estado em travel.state.gov/content/childabduction/en/legal/compliance.html.

Antissemitismo

Segundo a Confederação Israelita do Brasil, há aproximadamente 120 mil cidadãos judeus, dos quais cerca de 50 mil estão no estado de São Paulo e 25 mil no estado do Rio de Janeiro. É ilegal escrever, editar, publicar ou vender livros que promovam o antissemitismo ou o racismo. A legislação permite à Justiça multar ou prender quem exibir, distribuir ou transmitir material antissemita e prevê pena de prisão de dois a cinco anos aos infratores que forem condenados.

Vários líderes de comunidades judaicas e inter-religiosas afirmaram que o antissemitismo explícito continuou limitado. Segundo reportagens locais, a Casa Mafalda, espaço autônomo de cultura e política na cidade de São Paulo, foi alvo de um grupo neonazista que pichou uma suástica e referências a Hitler no portão de entrada da instituição. Grupos neonazistas atuaram nos estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná.

Tráfico de pessoas

Consulte o Relatório sobre Tráfico de Pessoas do Departamento de Estado em www.state.gov/j/tip/rls/tiprpt/.

Pessoas com deficiência

A lei proíbe a discriminação contra pessoas com deficiência física ou mental no que se refere a emprego, viagens aéreas e outros meios de transporte, educação, sistema judiciário e acesso à assistência médica, e o governo federal de modo geral cumpriu tais disposições. Embora leis federais e estaduais determinem que seja garantido o acesso das pessoas com deficiência às edificações, os estados não as cumpriram efetivamente.

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, marco legal sobre os direitos das pessoas com deficiência, procura promover mais acessibilidade com o aumento da supervisão federal do Estatuto das Cidades, sanções penais mais severas para pessoas condenadas por discriminação em razão de deficiência e serviços de saúde inclusivos com disposição referente a serviços próximos de domicílios e em zonas rurais.

O Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência e o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso têm como principal responsabilidade a promoção dos direitos das pessoas com deficiência. Segundo a SDH, problemas específicos incluíram o fornecimento insuficiente de órteses e próteses modernas e a preços acessíveis, escassez de moradias com adaptações especiais a preços acessíveis e necessidade de mais acessibilidade no transporte público. Crianças com deficiência frequentaram escolas do ensino fundamental e médio e instituições de ensino superior, mas houve escassez de escolas com estrutura adequada. A falta de infraestrutura e escolas acessíveis limitou de maneira significativa a capacidade de as pessoas com deficiência participarem da força de trabalho.

Organizações da sociedade civil reconheceram que o monitoramento e a aplicação das políticas sobre deficiência continuaram precários e criticaram a falta de acessibilidade no transporte público, a aplicação insatisfatória das cotas de emprego e uma definição médica limitada de deficiência que muitas vezes exclui as deficiências de aprendizagem. O governo melhorou o acesso às pessoas com deficiência desenvolvendo infraestrutura e adaptando as instalações esportivas públicas em preparação para eventos esportivos como os Jogos Paralímpicos 2016.

Minorias nacionais/raciais/étnicas

A lei proíbe a discriminação racial, especialmente a negação do acesso a dependências públicas e privadas, ao emprego ou à moradia a qualquer pessoa com base na raça. A lei também proíbe o incitamento à discriminação e ao preconceito racial e a disseminação de símbolos e epítetos ofensivos a raças, punindo tais atos com penas de prisão.

O censo de 2010 revelou que, pela primeira vez, os brancos constituem menos da metade da população; aproximadamente 52% da população identificou-se como pertencendo a categorias diferentes de branco. Apesar dessa alta representação na população, os cidadãos de pele mais escura, em particular os afro-brasileiros, com frequência enfrentam discriminação.

Os afro-brasileiros são sub-representados no governo, em cargos profissionais e nas classes média e alta. A taxa de desemprego foi maior nesse grupo, e eles receberam salários médios abaixo dos salários de brancos em posições similares. Observou-se também uma considerável defasagem de escolaridade. Os afro-brasileiros foram afetados pela criminalidade de maneira desproporcional; segundo o relatório de uma comissão parlamentar de inquérito, a possibilidade de um adolescente negro ser vítima de homicídio é 3,7 vezes maior do que a de um branco.

O Estatuto da Igualdade Racial, de 2010, continuou a gerar polêmica, devido à disposição para políticas de ação afirmativa sem cotas na educação e no mercado de trabalho. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal confirmou a constitucionalidade dos sistemas de cotas raciais nas universidades. Uma lei de cotas entrou em vigor, dando às 59 universidades federais quatro anos para providenciar que metade de suas novas turmas seja formada por alunos provenientes de escolas públicas, que em geral contam com uma porcentagem mais alta de alunos afro-brasileiros do que as escolas privadas. A lei de 2010 determina que 20% dos cargos da administração pública federal sejam preenchidos por afro-brasileiros. Os estados de Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul têm leis similares para cargos da administração pública local. Em agosto, o Ministério do Planejamento determinou que os órgãos públicos devem criar comissões internas para verificar a veracidade da autodeclaração de etnia de candidatos a vagas no serviço público fazendo uso de aspectos fenotípicos, basicamente avaliando a cor do candidato na tentativa de reduzir abusos da política de ação afirmativa e leis afins.

Povos indígenas

Segundo dados da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do censo de 2010, há aproximadamente 896.900 indígenas, representando 305 grupos étnicos e 274 línguas. A lei concede à população indígena ampla proteção de seu patrimônio cultural, uso exclusivo de suas terras tradicionais e benefício do uso exclusivo do território. O Congresso precisa consultar as tribos envolvidas ao considerar solicitações de exploração de recursos minerais e hídricos, inclusive aqueles com potencial energético, em terras indígenas. A lei concede às tribos indígenas uma porcentagem dos lucros resultantes da mineração. Segundo a Constituição, todos os minérios acima e abaixo do solo, bem como o potencial hidrelétrico, pertencem ao governo. A Funai é responsável pelo processo de consulta indígena, mas grupos de direitos humanos manifestaram preocupação com o fato de a maioria das exigências para consulta aos indígenas não ter sido atendida e de o orçamento do órgão ter sido cortado de maneira significativa durante o ano.

Extração ilegal de madeira, tráfico de drogas e mineração, além de mudanças no meio ambiente causadas por grandes projetos de infraestrutura, forçaram as tribos indígenas a se deslocar para outras áreas ou reduziram seus territórios demarcados em relação ao que havia sido estabelecido por lei.

Segundo a Funai, o governo federal estabeleceu as regras para o fornecimento de indenização pela ocupação de boa-fé de terras indígenas, como no caso de empresas que obtiveram contratos de desenvolvimento que afetam terras indígenas. Vários povos indígenas protestaram contra a lentidão nas demarcações de terra.

O último relatório do Conselho Indigenista Missionário, de 2015, citou dados da Secretaria Especial da Saúde Indígena mostrando que 137 índios foram mortos no país. Levantamento do conselho registrou 54 assassinatos de índios em todo o país. Em junho, o agente de saúde indígena Clodiode Aquileu Rodrigues de Souza foi assassinado a tiros e seis índios foram feridos no município de Caarapó, no estado de Mato Grosso do Sul, em terras reivindicadas pelo grupo indígena guarani-kaiowá. Homens armados agindo sob instruções de produtores rurais teriam realizado o ataque, em represália à comunidade indígena ter buscado reconhecimento de seus direitos à terra.

Atos de violência, discriminação e outros abusos com base em orientação sexual e identidade de gênero

A legislação federal não proíbe a discriminação com base na orientação sexual, mas vários estados e municípios têm regulamentos administrativos que proíbem esse tipo de discriminação e preveem igualdade de acesso aos serviços públicos. A discriminação social continuou sendo um problema, em especial contra a população de transgêneros. A violência contra pessoas LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexuais) foi motivo de séria preocupação, com ONGs locais informando que, até junho, 139 LGBTIs foram vítimas de mortes por ódio.

O Código Penal determina que infrações sujeitas a ação penal se enquadram nas leis federais, deixando os crimes de ódio sujeitos a punições administrativas e não criminais. São Paulo é o único estado a codificar punições para a violência motivada por ódio e discursos contra pessoas LGBTI. No estado do Rio de Janeiro, a lei pune estabelecimentos comerciais que discriminam com base na orientação sexual. As sanções variam de advertências e multas a suspenção temporária ou cassação da inscrição estadual. As multas podem chegar a R$ 15.600

Em 2 de julho, Diego Vieira Machado, aluno da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi encontrado morto no campus do Fundão, localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro. Seu corpo estava parcialmente despido e mostrava sinais de abuso. Amigos alegaram que o fato de ser gay, negro, pobre e nortista certamente teve peso. Também disseram que Machado havia recebido várias ameaças antes do ataque.

O Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT, composto por membros da sociedade civil e de órgãos governamentais, combateu a discriminação e promoveu os direitos das pessoas LGBTI. As reuniões são abertas ao público e transmitidas pela internet.

HIV e Aids – estigma social

A discriminação contra portadores de HIV/Aids é punível, caso haja condenação, com até quatro anos de prisão e multa. Organizações da sociedade civil e a imprensa denunciaram a discriminação contra pessoas com HIV/Aids. Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids no Brasil, a discriminação contra certos grupos, em particular homens homossexuais, fez com que as pessoas hesitassem em procurar testes e tratamento para o HIV.

Outros tipos de violência social ou discriminação

Segundo a ONG católica Comissão Pastoral da Terra, violência no campo, ameaças de morte e assassinatos de ambientalistas continuaram a ocorrer. Comunicado à imprensa da comissão citou 47 assassinatos de ambientalistas até setembro. A Global Witness informou 50 assassinatos de ambientalistas em 2015 (com 90% ocorrendo nos estados de Maranhão, Pará e Rondônia).

Em outubro, Luiz Araújo, secretário de Meio Ambiente e Turismo da cidade de Altamira, no estado do Pará, foi morto a tiros na entrada de casa. Segundo veículos de comunicação, essa teria sido uma morte encomendada, e uma conhecida de Araújo disse que ele estava sofrendo pressão por suas ações contra o desmatamento ilegal.

O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos também informou que, nos primeiros quatro meses do ano, 24 defensores de direitos humanos foram mortos, 21 deles de organizações que defendiam os direitos à terra.

Seção 7. Direitos dos trabalhadores

 

a. Liberdade de associação e direito de negociação coletiva

A lei prevê a liberdade de associação para todos os trabalhadores (exceto militares, policiais militares e bombeiros), o direito à negociação coletiva com restrições e o direito à greve. A lei limita a organização na empresa e impõe um imposto sindical obrigatório para todos os trabalhadores e empregadores. Por lei, militares das Forças Armadas, policiais militares e bombeiros não podem fazer greve. Os policiais civis podem fazer greve e fizeram durante o ano. A lei proíbe a discriminação contra atividades sindicais, inclusive a demissão de funcionários candidatos a cargos ou detentores de cargos de liderança em sindicatos, e exige que os empregadores readmitam trabalhadores demitidos por atividades sindicais.

Os sindicatos novos devem se registrar no Ministério do Trabalho, que aceita o registro se não houver objeções por parte de outros sindicatos. A lei impõe certas restrições, como a unicidade sindical, que limita a liberdade de associação ao proibir a existência de vários sindicatos concorrentes na mesma categoria profissional em uma mesma área geográfica. Sindicatos que representam trabalhadores na mesma área geográfica e categoria profissional podem contestar o registro.

A lei estabelece que uma greve pode ser considerada “abusiva” pela Justiça do Trabalho, e o sindicato fica sujeito a penalidades legais caso viole determinadas condições, como deixar de manter serviços essenciais durante a greve, deixar de notificar os empregadores pelo menos 48 horas antes do início da paralisação ou não suspender a greve após decisão judicial. O empregador não pode contratar substitutos para trabalhadores grevistas nem fazer demissões devido a atividades relacionadas com paralisações, desde que a greve não seja considerada abusiva.

A lei obriga os sindicatos a negociar em nome de todos os trabalhadores registrados na categoria profissional e na área geográfica que representam, independentemente de o empregado pagar ou não a contribuição voluntária de associado. A lei permite ao governo rejeitar cláusulas de acordos coletivos que conflitem com as políticas governamentais. A negociação coletiva no setor público é proibida na prática; a Constituição a permite, mas a legislação de implementação ainda não havia sido promulgada até o fim de novembro.

A liberdade de associação e o direito à negociação coletiva em geral foram respeitados. A negociação coletiva foi comum em estabelecimentos do setor privado. As organizações de trabalhadores tiveram atuação independente do governo e de partidos políticos. Foram noticiados casos de intimidação e assassinatos de sindicalistas rurais. Em fevereiro, Francisca das Chagas Silva, trabalhadora rural filiada ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Miranda do Norte, foi morta depois de um ato de violência sexual. Ela havia tido participação ativa no Grupo de Estudo Sindical (GES Mulher) e em outras atividades organizadas pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais em 2015.

b. Proibição do trabalho forçado ou compulsório

A lei proíbe o que chama de “trabalho escravo”, definido como “reduzir alguém a condição análoga à de escravo”, o que inclui submeter alguém a trabalhos forçados ou a condições de exploração do trabalho em geral, como longas jornadas de trabalho, condições de trabalho sem higiene, trabalho extremamente árduo e realizado em condições degradantes. Embora nem todas as pessoas em situação de trabalho forçado, conforme definido pelas leis do país, tenham sido vítimas de tráfico para fins de exploração de trabalho, muitas o foram. O governo adotou uma série de ações para fazer cumprir a lei, mas o trabalho forçado ocorreu em vários estados. Violações das leis contra o trabalho forçado são puníveis com até oito anos de prisão, mas isso muitas vezes não foi suficiente para deter infrações. A legislação também prevê penalidades para vários crimes relacionados com o trabalho forçado, tais como recrutamento ou transporte ilegal de trabalhadores ou a imposição de contração de dívidas onerosas como condição de emprego.

A Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo coordenou os esforços do governo para combater o trabalho forçado e a exploração do trabalho e propiciou um fórum para contribuições da sociedade civil. Os membros da comissão incluem representantes de dez órgãos governamentais ou ministérios – como Direitos Humanos, Justiça, Polícia Federal, Agricultura, Trabalho e Meio Ambiente – e 20 grupos da sociedade civil. A Organização Internacional do Trabalho também é membro.

Equipes do Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do Trabalho realizaram inspeções-surpresa em propriedades onde havia suspeita de trabalho escravo – essas equipes são compostas por auditores-fiscais do Trabalho, procuradores do Ministério Público do Trabalho e agentes da Polícia Federal. As equipes móveis aplicaram multas aos proprietários de terra que fizeram uso de trabalho forçado e exigiram que os empregadores pagassem os salários atrasados e os benefícios trabalhistas antes de enviar os trabalhadores de volta aos seus municípios de origem. Auditores-fiscais e procuradores do Trabalho, no entanto, só puderam aplicar sanções civis; portanto, muitos casos não foram processados criminalmente. Os trabalhadores resgatados pelas equipes de fiscalização móvel tiveram direito a receber três meses de salário mínimo. Os governos estaduais de Mato Grosso, Bahia e Rio de Janeiro e a região “Bico do Papagaio” do estado de Tocantins forneceram recursos a um programa que ofereceu capacitação profissional para trabalhadores escravos resgatados. Até outubro, somente no estado de Mato Grosso, os trabalhadores resgatados haviam recebido R$ 1,1 milhão.

Em julho, auditores-fiscais do Trabalho resgataram dois cidadãos chineses vítimas de condições de trabalho forçado em uma lanchonete do Rio de Janeiro.

O trabalho forçado, inclusive o trabalho forçado de crianças, ocorreu em muitos estados, em áreas como desmatamento para pastagem de gado, extração de madeira, produção de carvão, pecuária e atividades agrícolas. O trabalho forçado quase sempre envolveu homens jovens oriundos de estados menos desenvolvidos do Norte e Nordeste — Maranhão, Piauí, Ceará e Tocantins — além do estado de Goiás, no Centro-Oeste, para trabalhar nas regiões Norte e Centro-Oeste do país. Além disso, houve relatos de trabalho forçado na indústria da construção civil também envolvendo homens jovens, principalmente do Nordeste. Casos de trabalho forçado também foram relatados em confecções de roupa na cidade de São Paulo; as vítimas quase sempre eram de países vizinhos, em particular Bolívia, Peru e Paraguai, mas também do Haiti, da Coreia do Sul e da China.

Consulte também o Relatório sobre Tráfico de Pessoas do Departamento de Estado em www.state.gov/j/tip/rls/tiprpt/.

c. Proibição do trabalho infantil e idade mínima para emprego

A idade mínima para o trabalho é 16 anos, e a aprendizagem pode começar aos 14 anos. A lei proíbe a todos os menores de 18 anos trabalhar em atividades que constituam ameaça à integridade física ou em condições insalubres, perigosas ou moralmente prejudiciais. O trabalho perigoso inclui uma extensa lista de atividades em 13 categorias ocupacionais, entre elas, serviço doméstico, coleta de lixo e produção de fertilizantes. A lei exige permissão dos pais para que os menores trabalhem como aprendizes.

Segundo o Ministério do Trabalho, nas últimas duas décadas, o número de menores trabalhando diminuiu de 8 milhões para 2,7 milhões. Restaram os casos mais difíceis de serem identificados por quase sempre se darem em áreas rurais inacessíveis ou em casas de família.

O Ministério do Trabalho é responsável pela fiscalização dos locais de trabalho e aplicação das leis contra o trabalho infantil. As sanções por violações variam de R$ 402 a R$ 1.891, dobrando para a segunda violação e triplicando para a terceira, e de modo geral foram aplicadas; no entanto, observadores afirmaram que as multas normalmente são muito baixas para servir de dissuasão eficaz. A maior parte das fiscalizações ocorreu em razão de denúncias de trabalhadores, professores, sindicatos, ONGs e meios de comunicação. Devido a restrições legais, os fiscais do Trabalho continuaram impedidos de entrar em residências e fazendas particulares, onde ocorre grande parte do trabalho infantil.

Em maio, estudo publicado por uma fundação de São Paulo dedicada à proteção dos direitos das crianças (Fundação Abrinq) constatou que 3,3 milhões de crianças e adolescentes (entre 5 e 17 anos) estavam em situação de trabalho infantil. A Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, do Ministério do Trabalho, continuou a implementar o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e manteve um banco de dados sobre as piores formas de trabalho infantil do país. O Grupo Móvel de Fiscalização de Combate ao Trabalho Infantil – baseado no Grupo Especial de Fiscalização Móvel de combate ao trabalho forçado em vigor desde 1995 – continuou a ampliar suas operações.

Consulte também Resultados sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil do Departamento do Trabalho em www.dol.gov/ilab/reports/child-labor/findings/.

d. Discriminação no emprego e na ocupação

As leis e normas trabalhistas proíbem discriminação com base em raça, sexo, gênero, deficiência, religião, opinião política, origem ou nacionalidade, idade, língua e orientação sexual ou identidade de gênero. Também é proibida a discriminação contra pessoas soropositivas para o HIV ou que sofrem de outras doenças transmissíveis. O governo de maneira geral fez cumprir essas leis e normas, embora a discriminação no emprego tenha ocorrido contra afro-brasileiros, mulheres, pessoas com deficiência, índios e transgêneros. O Ministério do Trabalho implementou regras para integrar a promoção da igualdade racial em seus programas, entre elas a exigência de que a raça seja incluída nos dados para programas financiados pelo ministério, inclusive o seguro-desemprego.

Segundo a ONG local Repórter Brasil, trabalhadores haitianos informaram ser vítima de discriminação no emprego. O Ministério do Trabalho publicou e distribuiu uma cartilha de direitos trabalhistas em português e crioulo haitiano, mas os trabalhadores – em especial da construção civil – queixaram-se de que alguns empregadores demonstraram comportamento racista e não informaram sobre os direitos dos haitianos conforme previsto em lei, incluindo benefícios da Previdência Social.

e. Condições aceitáveis de trabalho

Em janeiro, o salário mínimo nacional aumentou para R$ 880 por mês. Segundo dados do IBGE de 2016, a renda per capita de aproximadamente 40% dos trabalhadores está abaixo do salário mínimo. Dados do IBGE também mostraram que 6,8% dos trabalhadores (12,9 milhões) são considerados “extremamente pobres” ou ganham menos de R$ 70 por mês.

A lei limita a semana de trabalho a 44 horas e estabelece um período de descanso de 24 horas consecutivas, de preferência aos domingos. A lei também prevê o pagamento de férias anuais, proíbe o excesso de horas extras obrigatórias, limita as horas extras a duas horas por dia de trabalho e determina que cada hora trabalhada acima do limite mensal seja remunerada com, no mínimo, o valor de uma hora e meia de trabalho; de modo geral, tais disposições foram respeitadas para todos os grupos de trabalhadores no setor formal. A Constituição também prevê o direito dos empregados domésticos a uma jornada de trabalho de 8 horas diárias e máximo de 44 horas semanais, salário mínimo, intervalo para almoço, Previdência Social e verbas rescisórias. Segundo o IBGE, 39% dos trabalhadores estavam empregados no setor informal em 2015.

O Ministério do Trabalho estabelece normas ocupacionais, de saúde e segurança em conformidade com os padrões internacionais, no entanto, condições inseguras de trabalho foram comuns em todo o país, em especial na construção civil. A lei determina que os empregadores criem comissões internas de prevenção de acidentes de trabalho. Também proíbe a demissão de empregados por participarem dessas comissões. Os trabalhadores em geral puderam sair de situações que colocaram em perigo sua saúde ou segurança sem comprometer seu emprego, embora aqueles em situações de trabalho forçado sem acesso a transporte tenham ficado particularmente vulneráveis a situações que colocaram em perigo sua saúde e segurança.

Em julho, ONGs locais denunciaram violação de direitos trabalhistas, acidentes de trabalho e longas jornadas de trabalho na produção de alimentos e na indústria da carne em vários estados, inclusive São Paulo e Santa Catarina. Um motorista de caminhão informou ser obrigado a dirigir 20 horas por dia, de domingo a domingo. Em 28 de novembro, ocorreu uma explosão em uma fábrica de inseticidas no município de Diadema, na Grande São Paulo, ferindo pelo menos 16 pessoas, inclusive bombeiros. Segundo autoridades locais, a fábrica não tinha licença ambiental.

O Ministério do Trabalho tratou de problemas relacionados com infrações das condições aceitáveis de trabalho, como longas jornadas e condições de trabalho inseguras ou insalubres. As sanções por violações incluem multas que variaram enormemente dependendo da natureza da infração; as multas em geral foram aplicadas e às vezes foram suficientes para deter violações. A Escola Nacional da Inspeção do Trabalho realizou várias sessões de capacitação de auditores-fiscais do Trabalho durante o ano. O Ministério do Trabalho informou que o número de auditores-fiscais do Trabalho (2.500) foi insuficiente para fazer cumprir a total conformidade em todo o país.